Confesso que fui uma adepta tardia dos smartphones. Meu Nokia, diminuto em tamanho e funções, entregava tudo o que prometia; os poucos telefonemas e os envios e recebimentos de mensagens eram realizados sempre com sucesso. Porém, com o tempo, foi ficando cada vez mais difícil manter o novo nível ideal de comunicação com as pessoas, que agora se falavam praticamente em tempo real, o tempo todo. Evento que mudava de lugar dois minutos antes de acontecer, por causa do mal tempo. Imprevistos, alterações de planos de última hora. Contatos amorosos que já não respondiam SMSs, agora caros demais, com o advento dos aplicativos de chat (pretexto, talvez?).  E o pior de tudo, a gota d’água para mim: não dava mais para continuar pedindo informação de endereço para outros motoristas, transeuntes, taxistas. Ninguém sabia mais chegar a lugar algum sem a ajuda dos aplicativos.

Cedi. Comprei um smartphone. Agora circulo pela cidade com total independência dos outros coabitantes, mas total dependência do celular. Evito com sucesso ligações telefônicas – sempre as detestei. Sinto que funciono melhor por escrito. Coordeno jobs, veterinários dos meus cachorros, drink com as amigas e arranjos com o namorado simultaneamente, pelo aplicativo. Escrevo e-mails enquanto aguardo na recepção pela minha consulta médica (mais frequentemente do que gostaria, esqueço de enviar). E navego pelas redes sociais, zapeando velozmente pelo conteúdo. Navego enquanto espero o elevador. Navego enquanto meu namorado coloca a legenda na série que estamos prestes a assistir. Às vezes alguma manchete me chama a atenção, e até penso em checar o conteúdo em mais detalhe, mas aí alguma outra postagem me distrai. O que era mesmo que eu queria ler? Onde foi parar, aquele conteúdo que me interessou um segundo atrás, mas que agora eu não lembro o que era, tampouco quem compartilhou, para saber onde procurar? Logo esqueço, distraída, levada pela onda de fotos e letrinhas, sem me prender a nada. Passo o olho rápido por milhares de manchetes, sem distinguir o que é real do que é fake. Gatinhos travessos, viagens. Cinco maneiras de saber se seu cão é feliz. Quanta informação somos capazes de absorver, em uma fração de segundos? E quanta informação perdemos, nesse mesmo intervalo de tempo?

Tornei-me uma pessoa com algum nível de dificuldade de concentração. Ao mesmo tempo, é interessante notar que uma boa parte do conteúdo produzido e compartilhado na internet foi feito justamente para ser consumido assim, casualmente. Sem a menor necessidade de concentração, ou de tempo. Conteúdo curto e superficial, que pode ser lido (ou só olhado, mesmo) enquanto fazemos outras tarefas – e até mesmo que pode ser digerido enquanto consumimos outros conteúdos semelhantes, simultaneamente. Percebi recentemente que não consigo mais sequer ler um livro, ou texto longo, sem fazer essas pausas para zapear no celular. Não faz muito tempo, ficava um pouco assustada ao perceber que as pessoas não conseguiam aguardar o elevador, ou o ônibus, sem manterem os olhos fixos na tela do celular. Até que semana passada fiz uma viagem de metrô da Vila Madalena ao Paraíso sem nenhuma percepção do que acontecia ao meu redor, a ponto de ficar consternada quando cheguei ao meu destino. Foi como se eu tivesse sido tele transportada. Minutos da minha vida que eu não vi passar, lendo um monte de nada.

Até aí, sei que estou chovendo no molhado. Tem uma campanha muito bacana da Vivo chamada “Tem hora para tudo”, que explora a questão de sabermos aproveitar os momentos off-line.  Porém, as indagações que me atormentam agora são da ordem do ovo e da galinha. O que veio primeiro: nossa incapacidade de ler um texto longo com a máxima atenção, ou os textos curtos de consumo rápido nas redes sociais? Quem, produtor de conteúdo online ou não, nunca se deparou com a máxima de que textos online, para serem lidos, devem ser sempre curtos, curtíssimos?  E a enxurrada de listas? Diga-me um assunto sobre o qual ainda não há uma lista de dez mais, e eu te farei rainha (ou rei, você é quem escolhe!). Mas longe de mim te aconselhar a ignorar essas dicas – até porque, se utilizadas com parcimônia e com atenção a outros aspectos, como a checagem da relevância do texto e a boa redação, entre outros, são dicas bem úteis. O meu ponto é que acho que há um espaço para os comunicadores e produtores de conteúdo em geral serem fomentadores de mudança na vida das pessoas.

Vocês já devem ter ouvido falar em atenção plena, ou mindfulness. Resumidamente, significa estar presente no momento – ao invés de divagando em preocupações, ou zapeando no celular.  Estudos comprovam que o exercício de tentar estar presente e desfrutar o momento em que vivemos, quer por meio de meditação ou outras atividades práticas, traz benefícios importantes à saúde, em especial naquilo que concerne problemas como ansiedade e estresse. Ler com concentração, além de ser mais prazeroso, é uma maneira de exercitar a atenção plena.

Portanto, nós, profissionais da comunicação e da escrita, não temos o poder e o mecanismo de mudar o mundo e suas dinâmicas, mas podemos (e devemos, creio eu) ser geradores de alternativas. Como? Espalhando por aí pílulas de descanso. Criando oportunidades para as pessoas poderem escolher ler algo mais longo e completo, se desejarem. Temos as ferramentas e meios necessários para criar e disseminar um oásis de concentração, de profundidade, de argumentos bem embasados, desenvolvidos e estruturados. Informação que agregue e que, pasmem, informe, ao invés de manter os leitores em um limbo de distração.

Temos a oportunidade de criar bem-estar por meio da leitura e, quem sabe, iniciar um círculo virtuoso. Todo mundo um pouquinho mais bem informado, menos estressado e mais feliz já é o primeiro passo para um mundo melhor, não acham?